Abaixo, transcrevo a questão do Pedro:
Caderno Alga – questão 57
Situação hipotética:
Pedro trabalha como professor remunerado de uma escola particular e, concomitantemente, explora atividade econômica agropecuária em regime de economia familiar em uma chácara de dois módulos fiscais. Assertiva: Nessa situação, Pedro é segurado obrigatório do RGPS em relação a cada uma das atividades realizadas.
Gabarito preliminar: C
Gabarito definitivo: E
Meu comentário:

Entendo que o gabarito da questão é CERTO. De acordo com o § 2º do art. 11 da Lei 8.213/91, "todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas".

Na questão em tela, Pedro exerce, concomitantemente, duas atividades econômicas remuneradas, sendo ambas sujeitas ao RGPS: a atividade de professor de uma escola particular e a atividade econômica agropecuária. Nessa situação, Pedro é segurado obrigatório do RGPS em relação a cada uma das atividades exercidas.

Na condição de  professor de uma escola particular, Pedro é segurado obrigatório do RGPS como empregado. Em relação à atividade econômica agropecuária, Pedro é segurado obrigatório como contribuinte individual.

Nas justificativas de alterações de gabarito, no tocante à questão em tela, a Banca Examinadora escreveu o seguinte:
"A afirmação feita no item contraria o disposto no § 10 do artigo 11 da Lei n.º 8.213/1991."
Para tentar entender onde a Banca Examinadora quer chegar, transcrevo abaixo o inteiro teor do § 10 do art. 11 da Lei 8.213/91:
§ 10. O segurado especial fica excluído dessa categoria:
I – a contar do primeiro dia do mês em que:
a) deixar de satisfazer as condições estabelecidas no inciso VII do caput deste artigo, sem prejuízo do disposto no art. 15 desta Lei, ou exceder qualquer dos limites estabelecidos no inciso I do § 8º deste artigo;
b) enquadrar-se em qualquer outra categoria de segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social, ressalvado o disposto nos incisos III, V, VII e VIII do § 9º e no § 12, sem prejuízo do disposto no art. 15;
c) tornar-se segurado obrigatório de outro regime previdenciário; e
d) participar de sociedade empresária, de sociedade simples, como empresário individual ou como titular de empresa individual de responsabilidade limitada em desacordo com as limitações impostas pelo § 12;
II – a contar do primeiro dia do mês subsequente ao da ocorrência, quando o grupo familiar a que pertence exceder o limite de:
a) utilização de terceiros na exploração da atividade a que se refere o § 7º deste artigo;
b) dias em atividade remunerada estabelecidos no inciso III do § 9º deste artigo; e
c) dias de hospedagem a que se refere o inciso II do § 8º deste artigo. 
Como dá para perceber, o § 10 do art. 11 da Lei 8.213/91 estabelece a data que o segurado especial fica excluído dessa categoria. Mas vale frisar que, em relação à atividade agropecuária, embora trabalhe em regime de economia familiar numa propriedade de dois módulos fiscais, Pedro não é segurado especial, pois ele tem outra fonte de rendimento (a da atividade de professor). Se pedro trabalhasse como Professor por um período não superior a 120 (cento e vinte) dias no ano civil, isso não descaracterizaria sua condição de segurado especial (Lei 8.213/91, art.11, § 9º, III). Mas como a questão afirma que ele trabalha como professor remunerado de uma escola particular, presume-se que seja por um período superior a 120 dias, pois o ano letivo tem uma quantidade de dias superior a 120 dias.

Para um melhor entendimento, vale a pena transcrever o disposto no inciso III do § 9º do art. 11 da Lei 8.213/91:
§ 9º  Não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de:
[...]
III - exercício de atividade remunerada em período não superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil, observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; 
De acordo com a alínea "a" do inciso V do art.11 da Lei 8.213/91, é segurado obrigatório do RGPS, como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária, a qualquer título, em caráter permanente ou temporário, em área superior a 4 (quatro) módulos fiscais; ou, quando em área igual ou inferior a 4 (quatro) módulos fiscais ou atividade pesqueira, com auxílio de empregados ou por intermédio de prepostos; ou ainda nas hipóteses dos §§ 9º e 10 deste artigo;
Assim, como Pedro se enquadra na hipótese prevista no § 9º do art. 11 da Lei 8.213/91 (ter outra fonte de rendimento), ele não é segurado especial.

Portanto, em relação à atividade econômica agropecuária, Pedro é segurado obrigatório como contribuinte individual (Lei 8.213/91, art. 11, V, "a"). E em relação à atividade de professor de uma escola particular, Pedro é segurado obrigatório como empregado (Lei 8.213/91, art. 11, I, "a").

Diante da justificativa para trocar o gabarito apresentada pela Banca Examinadora, dá para perceber que ela elaborou a questão tendo em mente que, em relação à atividade econômica agropecuária, Pedro seria segurado especial. Ao examinar os recursos apresentados pelos candidatos, a Banca percebeu que Pedro não era segurado especial e, por isso, considerou o enunciado da questão como ERRADO. Mas em momento nenhum a questão afirma que Pedro seja segurado especial. A questão afirma que "Pedro é segurado obrigatório do RGPS em relação a cada uma das atividades realizadas". Sim! Ele é segurado obrigatório do RGPS em relação a cada uma das atividades realizadas. Repito para não ficar nenhuma dúvida: em relação à atividade econômica agropecuária, Pedro é segurado obrigatório como contribuinte individual (Lei 8.213/91, art. 11, V, "a"); e em relação à atividade de professor de uma escola particular, Pedro é segurado obrigatório como empregado (Lei 8.213/91, art. 11, I, "a").

Diante do exposto, percebe-se que a Banca Examinadora não poderia ter trocado o gabarito da questão de CERTO para ERRADO. A justificativa dada pela Banca Examinadora, citando o § 10 do art. 11 da Lei 8.213/91, não faz o menor sentido.

A questão em tela está sendo discutida no âmbito Judicial

Uma candidata que foi prejudicada pela alteração do gabarito da questão em tela, inconformada com a decisão da Banca Examinadora, recorreu à Justiça Federal do Paraná, por meio da Ação Judicial nº 5034116-85.2016.4.04.7000, que pode ter seu andamento consultado no site www.jfpr.jus.br.

Nos autos da referida ação judicial, foi deferida parcialmente a tutela de urgência pleiteada pela candidata, para determinar a reserva de vaga à autora, até ulterior decisão em contrário neste processo.

Eu tive acesso à CONTESTAÇÃO apresentada pelo Cebraspe. Transcrevo parte da referida contestação:
"Destaque-se, nesse ponto, que, no caso concreto, Pedro, de fato, reúne condições para, caso tenha interesse, vincular-se ao RGPS na qualidade de contribuinte individual, ou seja, ele se qualifica para se tornar contribuinte individual, mas não se pode afirmar categoricamente que ele seja contribuinte individual, uma vez que esse enquadramento depende da realização de procedimentos específicos a serem adotados por ele para essa finalidade, procedimentos esses não explicitados no conjunto de hipóteses apresentada no item.
Nesse sentido, quando a lei declara “São segurados obrigatórios...”, ela apresenta os requisitos que o indivíduo deve atender para ser segurado obrigatório, diferentemente da situação concreta, em que se afirma que Pedro “é segurado obrigatório”, sendo que, para tanto, ele teria que ter desenvolvido ações que não estão elencadas nas hipóteses oferecidas.
A título de exemplificação de situações concretas em que não se teria qualquer garantia da materialidade da dupla filiação, podemos citar o caso em que Pedro já efetuasse o recolhimento para INSS no teto legalmente previsto pela atividade de professor, de modo que, de sua parte, não haveria qualquer interesse em se filiar ao RGPS na condição de contribuinte individual. Outro caso possível é aquele em que Pedro, mesmo vindo a vincular-se ao RGPS na condição de contribuinte individual, deixe de efetuar os recolhimentos cabíveis, situação em que eventualmente essa vinculação seria extinta.
Sendo assim, não é possível afirmar, categoricamente, que Pedro é segurado obrigatório na condição de contribuinte individual pela atividade econômica agropecuária em regime de economia familiar em uma chácara de dois módulos fiscais, pois as hipóteses estabelecidas no item não são suficientes para garantir essa conclusão. Por essa razão, a afirmação feita no item deve ser julgada como ERRADA."
As alegações apresentadas pelo Cebraspe são absurdas. O texto acima começa afirmando que a pessoa só se vincula ao RGPS como contribuinte individual se ela "tiver interesse". O Cebraspe, em sua contestação, trata o contribuinte individual como se ele fosse um segurado facultativo. Para o segurado facultativo, sim, a filiação representa ato volitivo (Decreto nº 3.048/99, art. 11, § 3º). Mas o contribuinte individual é um segurado obrigatório (Lei 8.213/91, art. 11, V). Para o segurado obrigatório, a filiação decorre, automaticamente do exercício da atividade remunerada (Decreto nº 3.048/99, art. 20, § 1º). Portanto, para o contribuinte individual, a filiação é compulsória, indepentetemente do seu interesse.

Na sua contestação, o Cebraspe reconhece que  "Pedro, de fato, reúne condições para vincular-se ao RGPS na qualidade de contribuinte individual, ou seja, ele se qualifica para se tornar contribuinte individual". Sendo assim, não há o que discutir: Pedro é segurado obrigatório como contribuinte individual em relação ao exercício da atividade agropecuária que ele exerce.

Outro equívoco da contestação do Cebraspe está na seguinte frase:
"podemos citar o caso em que Pedro já efetuasse o recolhimento para INSS no teto legalmente previsto pela atividade de professor, de modo que, de sua parte, não haveria qualquer interesse em se filiar ao RGPS na condição de contribuinte individual."
A afirmativa acima transcrita está equivocada. Mesmo que, na atividade de professor, Pedro já recolhesse contribuição sobre o teto do RGPS, ainda assim, ele também seria filiado como contribuinte individual. Ele apenas estaria desobrigado de recolher contribuição previdenciária na condição de contribuinte individual, pois, na condição de professor, já teria atingido o teto contributivo. Mas mesmo assim, seria segurado contribuinte individual em relação à atividade agropecuária. Repito o disposto no § 2º do art. 11 da Lei 8.213/91: "Todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas".

O Cebraspe também se equivoca ao afirmar o seguinte:
"Outro caso possível é aquele em que Pedro, mesmo vindo a vincular-se ao RGPS na condição de contribuinte individual, deixe de efetuar os recolhimentos cabíveis, situação em que eventualmente essa vinculação seria extinta."
A afirmativa acima transcrita também está equivocada. Se Pedro deixar de efetuar os recolhimentos cabíveis, ele torna-se um devedor da Previdência Social, mas o seu vínculo com o RGPS não será extinto. Se Pedro deixar de recolher suas contribuições na condição de contribuinte individual, caberá a Receita Federal, por meio de lançamento tributário, constituir o crédito tributário da Previdência Social, increvê-lo na Dívida Ativa da União e, por meio da Procuradoria da Fazenda Nacional, ajuizar uma ação de execução fiscal para cobrar judicialmente o contribuinte devedor.

Precebe-se, portanto, que quanto mais o Cebraspe fala sobre a questão em tela, mas fica claro que ele cometeu uma grande injustiça ao ter alterado o gabarito preliminar da questão de CERTO para ERRADO.